Nobres & vagabundos: os novo nobres

Por Franco Átila

Nietzsche é um filósofo reacionário, não importa o quão vanguardista ele seja. O que mais seria, senão reaça, quem defende a aristocracia como regime político ideal?

Mas há um jeito de salvar Nietzsche, não para ele (que certamente riria de tal presunção), mas para nós. Ele odiava o escravo, o espírito de cordeiro que se manifestava no cristão e no democrata burguês (uma extensão do cristão). Por isto ele recusava a ideia de uma democracia burguesa, que seria apenas um governo de escravos.

Nisto, ele acertou em cheio, assim como os roqueiros brasileiros. A democracia representativa, sua igualdade formal, suas leis e instituições, seu ideal de cidadania e a mitologia do estado de direito nada mais são que a face política da escravidão capitalista. Desejar a democracia e, na democracia, querer o conforto “civilizado” da vida classe média é querer ser escravo, como todos queremos.

Um projeto para a emancipação do capitalismo seria, não a retomada reacionária de um regime aristocrático, como Nietzsche queria, mas a recuperação, para cada indivíduo, de uma certa nobreza de caráter.

A sociedade emancipada do capitalismo exigiria uma revolução antropológica que extirparia os afetos submissos do escravo (trabalhador, gerente, rentista, proprietário) que nos habita, para colocar, em seu lugar, os afetos altivos do nobre: o orgulho e a generosidade, o autogoverno de si, o amor ao ócio, o ódio do trabalho e, principalmente, o desprezo pelo escravo. Desprezo, não por um escravo fora de nós, por um povo ou grupo social que deveria ou mereceria ser escravizado, mas pelo escravo interior, submisso voluntário à toda sorte de tiranos: padres e pastores, democracia de massas, capital.

Numa sociedade emancipada do capitalismo, o exercício da nobreza não seria para manter os privilégios de uma elite opressora, como nas aristocracias do passado. Mesmo porque a sociedade emancipada seria desprovida de classes e castas, composta em sua totalidade por homens e mulheres nobres e iguais. A luta pelo triunfo da nobreza se daria principalmente no espaço íntimo da psique, se expandindo para o fora social. A nobreza pessoal se afirmaria como recusa à qualquer submissão, seja a uma pessoa, a determinados grupos sociais ou a senhores abstratos e impessoais, como a técnica e o capital.

O nobre deve ter orgulho de sua liberdade radical, mas também deve ser capaz de identificar falsas liberdades e combatê-las com ferocidade. No capitalismo tardio, por exemplo, os neoliberais e os ditos libertários acreditam-se pessoas de mentes livres por lutarem contra o leviatã estatal. Advogam que, ao contrário do estado, o mercado proporciona o exercício pleno da liberdade. Em suas ilusões, trocam um senhor ruim, o estado, por outro pior ainda, o mercado, que é a expressão mais direta do capital e suas coerções impessoais. Neoliberais, liberais e libertários têm espírito de escravos e não sabem: acreditam-se livres. A escravidão inconsciente é a mais eficaz que há. E a mais perigosa também.

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